Têm surgido várias declarações
públicas, provindas do Ministério da Educação acerca da autonomia das escolas.
O próprio Ministro da Educação terá dito que "há muito a fazer na
autonomia das escolas". Este é um discurso que sucede ao cheque-ensino, e mais uma tentativa de desresponsabilizar o Estado face ao ensino e educação, coarctando
meios, delegando as difíceis questões da colocação de professores e deflectindo
as críticas das famílias. Nada de novo nem de bom se anuncia na 5 de Outubro…
Mas, e que mas… esta é mais
uma tentativa de deitar fora o bebé junto com a água do banho, se me perdoam a
grosseira mas ilustrativa expressão.
Repensar a escola, algo com
que todos parecem concordar, é repensar a autonomia das escolas. As escolas
centralizadas, de currículo único foram uma etapa importante na democratização
e universalização do ensino, marcaram uma viragem, a par da ocorrida na
sociedade, numa época em que a industrialização passou a requerer trabalhadores
mais qualificados a par com a libertação da mulher das tarefas domésticas,
ocupando os jovens até que estivessem em condições de enformar a mão-de-obra
nas fábricas. E assim cresceu a escola durante cinquenta anos, ao longo de várias gerações
de alunos e professores que não conheceram outra realidade nem (salvo honrosas
excepções) questionaram a escola.
Questionar a escola é reforçar
o ensino e construir alternativas, é uma exigência imperiosa para seus actores. É neste
quadro que a autonomia das escolas se torna pertinente e necessária, como forma
de apresentar novas soluções a problemas complexos, demasiado complexos para
que sejam deixados aos caprichos da 5 de Outubro.
Os desafios e oportunidades
que a escola apresenta colocam-se em primeiro lugar às comunidades em que esta
se insere e deve ser encontrado um equilíbrio entre a homogeneidade e a especificidade
das escolas. Uma glocalização do ensino, se quiserem utilizar um palavrão. A
solução passa no meu entender pela definição de um currículo e uma carga
horária mínimos, transversais a todas as escolas, um efectivo suporte no que
respeita a meios financeiros e logísticos por parte do Estado, uma
monitorização correcta e uma avaliação participada. Um currículo mínimo que
permita a integridade nacional do ensino, mas que deixe espaço para soluções
complementares de natureza curricular e comunitárias, construídas localmente.
O que está por trás da
autonomia anunciada pelo Ministério da educação é exactamente o oposto: centralizar
a decisão, imobilizar através da pressão e sobrecarga administrativa e delegar
as responsabilidades, em particular no que toca ao financiamento. E depois
fingir que é exigente, avaliando enviesadamente os resultados dos alunos em
provas escritas, como se tal fosse avaliar a escola. O sucesso da escola e dos alunos não é medido pelo seu
desempenho futuro em provas escritas. O sucesso das
escolas está na sua capacidade de formar alunos capazes de pensar criticamente a sociedade e actuarem responsavelmente, de olhos postos no mundo e no
futuro face a essa realidade. Isso só se consegue se as escolas forem capazes
de se integrarem na comunidade, de forma colaborativa e nesse contexto contribuírem
para o seu desenvolvimento. Essa é uma tarefa que só será atingida num contexto
de liberdade e responsabilidade. Neste momento a actuação do Ministério da Educação
é o maior entrave a que isso aconteça.
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