Há muito que busco conhecer as relações entre a Escola Oficina nº1
e a Escola Moderna de Ferrer. O assunto não é novo nem está encerrado. A
Educação progressista da 1ª República continua a ser algo que admiro e que
mantenho como referencia para o que entendo que deve(ria) ser o desenvolvimento
da educação em Portugal nos dias de hoje. Não era perfeita nem responde na
integra aos desafios que hoje se colocam à sociedade, mas contém a semente de
liberdade e sonho que a ditadura (quase) matou e hoje muitos querem enterrar
definitivamente.
Mas minha surpresa de hoje foi a decoberta
de um nome maior da educação na 1ª Republica que eu desconhecia, ou pelo menos
não lhe havia reconhecido o devido papel e mérito: César Porto.
César Porto além de uma longa e
diversificada carreira no ensino foi colega contemporâneo de Adolfo Lima na
Escola Oficina nº1 (já leccionava na Escola Oficina antes de Adolfo Lima e nela
permaneceu após a saída deste) e - aqui está o elo - integrou em 1919 uma
comitiva de professores que visitou a União Soviética a convite da Federação
Pan-Russa dos Trabalhadores do Ensino, tendo contacto com várias escolas
naquele país e com os métodos de ensino aí praticados, saídos da recente
revolução Socialista e visando construir uma sociedade comunista.
César Porto, publicou na Revista
Educação Social, em 1927, uma série de 4 artigos, todos intitulados
"Pedagogia Soviética" em que se percebe o fascínio que sentiu pela realidade
do ensino que conheceu. Uma pedagogia que “visava formar cidadãos soviéticos capazes
de compreender, dirigir e fazer desenvolver a sociedade em que viviam e, além
disso, formar profissionais úteis e conscientes”, “formar entes humanos,
completos, adequados ao seu momento e preparando o porvir”
Nas escolas que visitou reconheceu aspectos da Escola Nova que
impulsionara em Portugal bem como outros que reconheceu como válidos:
- A criança era o centro das preocupações publicas e era vista
como portadora do futuro (…)
- Nas
escolas maternais era utilizada uma metodologia inspirada em Montessori e
Froebel, mas adaptada à realidade russa
-
Abolição dos castigos físicos
- A não existência
de “exames de passagens”
- Ausência
de ensino religioso
- Os espectáculos
eram utilizados como processo educativo
- a existência
de aulas práticas, nomeadamente na área de física e química
- A existência
de uma grande autonomia dos alunos (a que César Porto criticava como excessiva)
- A
escola activa, com “museus laboratórios e aparelhos” como ideal pedagógico soviético,
e constituía matéria para formação continua dos professores. Além de activa era
a “escola do trabalho” em que os dois cam+pos estavam fortemente interligados e
coexistiam no tempo.
No entender
de César Porto, além das qualidades que reconhecia no Sistema de Ensino Soviético,
admirava a velocidade da sua expansão e evolução, desde a revolução, condições
que considerava fundamentais para Portugal daquela época – em que se construía uma
nova sociedade a partir de estruturas sedimentadas ao longo de séculos e
adequadas aos regimes monárquicos.
Estas e outras ligações dos Pedagogos progressistas da 1ª República permitem compreender esse período fascinante da Educação em Portugal, mantendo viva a chama do sonho que comanda a vida mas também a educação enquanto via de construção de uma nova sociedade, tal como esses homens a conceberam.
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Notas:
Este texto apenas foi possivel graças ao trabalho do Prof. Dr. Luiz Carlos Barreira sobre a Imprensa Educacional em Portugal no Inicio da Républica, publicado na Revista Teias nº32 (agosto/maio)
As 4 edições de 1927 da revista "Educação Social" em que o trabalho do Dr. César Porto foi publicado existem em acervo físico e digital na Biblioteca Nacional, mas infelizmente o seu conteúdo apenas está disponível para consulta local... Aliás tanto quanto consegui perceber o Dr. César Porto terá deixado uma extensa obra escrita: colaborou com "A Batalha" e muito provavelmente escreveu para o "Boletim da Escola Oficina nº1", fez parte do conselho Pedagógico da Universidade Popular Portuguesa.
A revista "Educação Social" foi criada por Adolfo Lima e terminou com a sua prisão (por razões políticas) em 1927. César Porto e Emilio Costa foram colaboradores habituais da revista, tendo a sua linha editorial comungado das ideias dos três pedagogos.
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